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ARTHIS 2ª EDIÇÃO DÉCADA DE 1920 SEMANA DE ARTE MODERNA AS TRÊS CASAS MODERNISTAS DE WARCHAVCHIK O PAISAGISMO DE MINA KABLIN MOBILIÁRIO MODERNO URBANISMO MODERNO ENTREVISTA COM JOSÉ LIRA

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A 2ª edição da Revista ARTHIS trás um recorte da década de 1920 focando no campo da arte, urbanismo, paisagismo, arquitetura bem como o manifesto de Warchavchik e seu impacto na arquitetura moderna brasileira.

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Page 1: Revista ARTHIS

ARTHIS2ª EDIÇÃO

DÉCADA DE 1920

SEMANA DE ARTE MODERNAAS TRÊS CASAS MODERNISTAS DE WARCHAVCHIK

O PAISAGISMO DE MINA KABLINMOBILIÁRIO MODERNOURBANISMO MODERNO

ENTREVISTA COM JOSÉ LIRA

Page 2: Revista ARTHIS

EQUIPEBÁRBARA VERAS RODRIGUES QUEIROZ

13/0154148CAROLINA BRAGA BORGO

13/0105376DOUGLAS HENRIQUE DUARTE

13/0107883ÉRIKA DA SILVA TIBÚRCIO

13/0109011GUILHERME DE OLIVEIRA REIS

13/0113026

DISCIPLINAARQUITETURA E URBANISMO DO BRASIL

CONTEMPORÂNEO

PROFESSORAAMANDA CASÉ

Page 3: Revista ARTHIS

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2008

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Modernismo da décadade 20

As três casas modernis-tas de warchavchik

Mobiliário moderno

O paisagismo de mina kablin

Urbanismo moderno

Entrevista com josé lira

Sumário

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Aeditorial

semana de arte moderna bem como a exposição universal suscitou em muitos artistas da época a vontade de fazer algo moderno e verdadeiramente brasileiro, com Warchavchik não foi diferente.Em seu Manifesto, que sofreu grandes influências de Le Corbusier, o arquiteto faz uma crítica a supervalorização dos estilos e a perda de identidade que os arquitetos estavam passando na época. Para isso, enumera regras para se fazer uma arquitetura correta, que buscaria no passado, nos denominados estilos, apenas poucos elementos que seriam usados de maneira a não ameçar a produção de uma arquitetura genuina-mente brasileira e original.Ainda veremos os desafios que Warchavchik enfrentou com a escassez de materiais como concreto e vidro bem como a excassez de mão de obra com especialização.Durante toda a década de 1920 o arquiteto produziu obras que entraram no hall das obras modernistas mais importantes do Brasil. Sua casa de 1928, a casa modernista da rua santa cruz foi a primeira obra moderna do Brasil e junta-mente com sua esposa, Mina, produziu uma “máquina de morar” que tomou para si como moradia. Além de sua evolução no campo da arquitetura, estudaremos mais a fundo seu desenvolvimento no design de mobiliário bem como o processo criativo de sua esposa para suas obras no paisagismo.

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cenário

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A década de XX no Brasil foi carac-terizada pelo acelerqado crescimento da industrialização e da urbanização, mas, ainda assim, permanece a tradição colo-nialista. De toda forma, com a expansão dos centros urbanos, modificaram-se os valores da cultura cotidiana e os próprios padrões da comunicação social; o cinema e as revistas ilustradas captavam um mundo feito de imagens. Era inev-itável que a arte expressasse as transfor-mações trazidas pela modernidade. Mas outros problemas também preocupavam artistas e intelectuais. "Nós não nos con-hecemos uns aos outros dentro do nosso próprio país.” ,frase do escritor carioca Lima Barreto, caracteriza bem o espírito da década de 1920. Era um tempo de indagações e descobertas. A tarefa que se impunha era a de construir a nação, e isso significava também repensar a cultu-ra, resgatar as tradições, costumes e etnias que haviam permanecido pratica-mente ignorados pelas elites. A questão da identidade nacional estava agora em primeiro plano: que cara tem o Brasil? Artistas e intelectuais buscaram respond-er a essa pergunta, e esse esforço foi uma característica importante do modernismo brasileiro. Isso não quer dizer que o mod-ernismo tenha sido um movimento homogêneo. Ao contrário: produziu ima-gens e reflexões sobre a nacionalidade profundamente contrastantes entre si. O marco do modernismo nas artes foi A Semana de Arte Moderna, real-izada em São Paulo em 1922. Dela, participaram escritores, pintores e músi-cos renomados da época, havendo sempre a indagação de como integrar tradição e modernidade. Mário de Andrade defendia a integração dinâmica do passado ao presente no "Prefácio interessantíssimo" de seu livro de poemas Paulicéia desvairada (1922), no qual definia o passado como "lição para meditar não para reproduzir".

Oswald de Andrade propôs o Manifesto Pau-Brasil (1924) e o Manifesto Antropofágico (1928). Sugeriu um proje-to de reconstrução da cultura nacional e defendeu que as idéias do futurismo, do dadaísmo e do surrealismo poderiam ser integradas à nossa cultura desde que fossem reelaboradas. Assim como houve esse marco nas artes, o marco na arquitetura foi feito com a Exposição Universal do Rio de Janeiro, também em 1922, comemoran-do o Centenário da Independência. A exposição fazia parte da Exposição Mundial, que aconteceu em 15 países. Ela consistia na construção de pavilhões nacionais criados do zero pelos países participantes, tendo como objeti-vo mostrar sua arquitetura. Era enorme para os padrões brasileiros. O visitante percorria 2.500 metros entre pavilhões descritos pela imprensa como "deslum-brantes monumentos arquitetônicos”. Foram erguidos 15 pavilhões estrangeiros. Na área nacional havia os palácios de festas, dos estados, da música, das diversões, da caça e pesca e muitos outros. Alguns desses prédios ainda podem ser vistos nos dias de hoje. A Exposição Universal durou até abril de 1923, e o número de expositores chegou a dez mil. Assim, a arquitetura no Brasil se vê nacionalista pelo momento em que vivia mas se vê, ao mesmo tempo, tendo inovações vindas da influência da arquite-tura internacional vista na exposição, nascendo o neocolonial e, então, o mod-ernismo.

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http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=837422https://pt.wikipedia.org/wiki/Exposi%C3%A7%C3%A3o_mundial

http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas1/anos20/ArteE-Cultura/SemanaDaArteModerna

http://www.exposicoesvirtuais.arquivonacional.gov.br/cgi/cgi-lua.exe/sys/start.htm?sid=257

http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVar as1/anos20/Centenari-oIndependencia/ExposicaoUniversalRJ

http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas1/anos20/ArteE-Cultura

O contexto

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A Exposição sendo construída

Vista aérea. À direita, o Morro do Castelo - berço da cidade - sendo desmontado para a realização da exposição. À esquer-da, o aterro do desmonte, onde seriam levantados os pavilhões e que déca-das depois daria origem ao Aeroporto Santos Dumont

Á esquerda o Pavilhão da Estatística (atual Centro Cultura da Saúde) e á direta o Pavilhão de Caca e Pesca.

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monismoder

A década de XX no Brasil foi carac-terizada pelo acelerqado crescimento da industrialização e da urbanização, mas, ainda assim, permanece a tradição colo-nialista. De toda forma, com a expansão dos centros urbanos, modificaram-se os valores da cultura cotidiana e os próprios padrões da comunicação social; o cinema e as revistas ilustradas captavam um mundo feito de imagens. Era inev-itável que a arte expressasse as transfor-mações trazidas pela modernidade. Mas outros problemas também preocupavam artistas e intelectuais. "Nós não nos con-hecemos uns aos outros dentro do nosso próprio país.” ,frase do escritor carioca Lima Barreto, caracteriza bem o espírito da década de 1920. Era um tempo de indagações e descobertas. A tarefa que se impunha era a de construir a nação, e isso significava também repensar a cultu-ra, resgatar as tradições, costumes e etnias que haviam permanecido pratica-mente ignorados pelas elites. A questão da identidade nacional estava agora em primeiro plano: que cara tem o Brasil? Artistas e intelectuais buscaram respond-er a essa pergunta, e esse esforço foi uma característica importante do modernismo brasileiro. Isso não quer dizer que o mod-ernismo tenha sido um movimento homogêneo. Ao contrário: produziu ima-gens e reflexões sobre a nacionalidade profundamente contrastantes entre si. O marco do modernismo nas artes foi A Semana de Arte Moderna, real-izada em São Paulo em 1922. Dela, participaram escritores, pintores e músi-cos renomados da época, havendo sempre a indagação de como integrar tradição e modernidade. Mário de Andrade defendia a integração dinâmica do passado ao presente no "Prefácio interessantíssimo" de seu livro de poemas Paulicéia desvairada (1922), no qual definia o passado como "lição para meditar não para reproduzir".

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No começo do século XX, o cenário arquitetônico brasileiro passava por uma intensa busca por identidade verdadeiramente nacionalista, com movi-mentos como o neocolonial tentando se erguer e suprir essa necessidade, foi o modernismo que surgiu como resposta para esses artistas. Segawa divide o começo do mod-ernismo no Brasil em duas fases: a primeira, a fase polêmica, em que mod-ernizar significava ir contra os valores acadêmicos, tradicionais e da negação do passado; e a segunda, a fase mais direcionada, onde o foco deixa de ser quebrar a arquitetura antiga e passa a ser atingir o verdadeiramente nacional e colocar a arquitetura brasileira no cenário arquitetônico internacional. Essa primeira fase foi mais protag-onizada por outras artes do que pela arquitetura, mas sua presença não é desprezível na análise de tudo que ocor-ria nessa década tendo em mente as influências diretas dessas exposições no ambiente fomentado para o início e aceitação da arquitetura modernista no Brasil. Dos pontos principais dela, se destaca a Semana de Arte Moderna e todo o processo que levaram a sua real-ização.

A Semana de Arte Moderna A semana de arte moderna de 1922 foi a primeira exposição futurista, como era chamado o movimento mod-ernista na época, de grande repercussão no Brasil. Fomentada do grupo de intelectuais organizados com o objetivo de modernizar a cena artística brasileira, de modo a seguir as tendências mundi-ais, futuristas, e deixar para trás de vez as influências da Europa (principalmente Portugal e França) tão presentes na expressão artística brasileira da época. No entanto, a segunda exposição de Anita Malfatti se diferenciou das outras manifestações tendo grande repercussão, primeiramente de sucesso e aceitação mas depois com uma drástica mudança, para crítica dura e rejeição do público e até mesmo devolução de obras vendidas na exposição. Essa mudança se deve ao artigo “Paranoia ou Mistifi-cação?” de Monteiro Lobato publicado no O Estado de São Paulo, que criticava duramente não só Anita Malfatti, mas como todos os artistas “que veem anor-malmente a natureza e interpretam-na à luz de teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica de escolas rebeldes, surgidas cá e lá como furúnculos da cultura exces-siva.” (LOBATO, Paranoia ou Mistificação, 1917).

O modernismo na década de 20por Erika Tibúrcio

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Com a grande comoção de pes-soas que partilhavam das opiniões de Lobato, uma onda contrária se formou ao redor de Anita Malfatti e do seus ideais, composta jovens intelectuais, onde Oswald de Andrade assume a liderança e respondeu a Monteiro Lobato no artigo "A exposição de Anita Malfatti" publicado no Jornal do Comércio. Esse grupo de intelectuais, intitulados como “futuristas”, seria o que o grupo que no futuro faria a organização e idealização da Semana de Arte Moderna. As exposições e apresentações da Semana foram vaiadas e criticadas, onde o maior parte do público era conser-vador, mas o objetivo foi atingido: romper com o passado e se libertar da cultura da Europa, além de abrir a mente da classe artística. A visão da imprensa sobre a Semana de Arte Moderna era ou extremamente positiva, pois conhecia o projeto de tornar o Brasil um país inde-pendente da cultura europeia, ou bastan-te negativa, por ser bastante conservado-ra, que desmereciam a proposta que os Modernistas traziam. A participação da arquitetura na semana de arte moderna foi pequena, tendo apenas dois arquitetos, nenhum deles tendo realmente uma ideologia que se pode chamar de modernista mas sim de quebra com o passado e incluídos com o intuito de tornar a semana mais completa. Antônio Garcia Moya, espanhol de arquitetura tradicionalista espanhola, mas que em desenhos demonstrava uma visão mais futurista, que se assemelha ao modernismo por menor presença de ornamentos e equilíbrio entre as formas; E Georg Przyrembel, polonês, apresentou desen-hos de sua interpretação do neocolonial em casas de praia.

Essa grande relação das artes com a arquitetura proporcionaram o caráter inicialmente estético do movimento. A relevância da semana de arte moderna na arquitetura moderna, então, não é expressada pelas obras que foram à exposição nem aos arquitetos que partic-iparam da mesma, mas sim de produzir um cenário propício para a fomentação dessa nova ideologia.

Manifestos de Rino Levi e Warchavchik Dá se início então, apenas alguns anos depois, em 1925, a segunda fase do modernismo quando começava a surgir de fato as manifestações na arquitetura, com os manifestos “A Arquitetura e a Estética das Cidades” de Rino Levi, publi-cado no O Estado de São Paulo, onde Levi elevava a importância da praticidade e economia, do uso de materiais industri-alizados e de uma arquitetura com linhas mais simples, sem ornamentos e verda-deiros em relação à estrutura; e “Acerca da Arquitetura Moderna” de Gregori Warchavchik, publicado no Correio da Manhã, onde Warchavchik defendia a racionalidade da máquina e negava a relação do estilo com o passado; Ambos manifestos estimulavam as mesmas práticas na arquitetura moderni-sta, que eram: Praticidade, economia e redução de ornamentos;Mas se diferiam na ideologia, onde Rino Levi defendia o uso de tradições neoclassicistas para a melhor adequação da arquitetura mod-erna no Brasil, levando em conta o clima, a vegetação e as próprias tradições do local, tudo isso para levar à uma arquite-tura mais adequada; Gregori Warchavchik por outro lado, negava completamente qualquer estilo anterior e comtemplava apenas o avanço da máquina e a estética vinda do seu uso em equilíbrio da sua forma e função.

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No começo do século XX, o cenário arquitetônico brasileiro passava por uma intensa busca por identidade verdadeiramente nacionalista, com movi-mentos como o neocolonial tentando se erguer e suprir essa necessidade, foi o modernismo que surgiu como resposta para esses artistas. Segawa divide o começo do mod-ernismo no Brasil em duas fases: a primeira, a fase polêmica, em que mod-ernizar significava ir contra os valores acadêmicos, tradicionais e da negação do passado; e a segunda, a fase mais direcionada, onde o foco deixa de ser quebrar a arquitetura antiga e passa a ser atingir o verdadeiramente nacional e colocar a arquitetura brasileira no cenário arquitetônico internacional. Essa primeira fase foi mais protag-onizada por outras artes do que pela arquitetura, mas sua presença não é desprezível na análise de tudo que ocor-ria nessa década tendo em mente as influências diretas dessas exposições no ambiente fomentado para o início e aceitação da arquitetura modernista no Brasil. Dos pontos principais dela, se destaca a Semana de Arte Moderna e todo o processo que levaram a sua real-ização.

A Semana de Arte Moderna A semana de arte moderna de 1922 foi a primeira exposição futurista, como era chamado o movimento mod-ernista na época, de grande repercussão no Brasil. Fomentada do grupo de intelectuais organizados com o objetivo de modernizar a cena artística brasileira, de modo a seguir as tendências mundi-ais, futuristas, e deixar para trás de vez as influências da Europa (principalmente Portugal e França) tão presentes na expressão artística brasileira da época. No entanto, a segunda exposição de Anita Malfatti se diferenciou das outras manifestações tendo grande repercussão, primeiramente de sucesso e aceitação mas depois com uma drástica mudança, para crítica dura e rejeição do público e até mesmo devolução de obras vendidas na exposição. Essa mudança se deve ao artigo “Paranoia ou Mistifi-cação?” de Monteiro Lobato publicado no O Estado de São Paulo, que criticava duramente não só Anita Malfatti, mas como todos os artistas “que veem anor-malmente a natureza e interpretam-na à luz de teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica de escolas rebeldes, surgidas cá e lá como furúnculos da cultura exces-siva.” (LOBATO, Paranoia ou Mistificação, 1917).

http://pre.univesp.br/as-reformas-do-rio-de-janeiro-no-ini-cio-do-seculo-xx#.V2sz1rgrLIU

http://www.comciencia.br/comciencia/?section=8&edi-cao=56&id=712

http://www.revistadehistoria.com.br/secao/reportagem/pas-sado-que-condena 11

Warchavchik se baseava nas teorias de Le Corbusier, utilizando de linguagem simples e até vaga para possi-bilitar a adequação de sua arquitetura à sua teoria. Em contradição com sua teoria, a produção de Warchavchik demonstra um caráter muito mais estéti-co do que funcional, levando ao ques-tionamento da veracidade modernista dessas obras. O impasse ética x estética se deu início assim, onde Warchavchik clara-mente escolheu a estética; Com sua primeira obra, a ferramenta para solidifi-car de vez seu nome e sua teoria, Warchavchik não enfrentou as dificul-dades econômicas e de industrialização, tendo que recorrer a meios para um fim. Iniciando-se na legalização do projeto na prefeitura onde foi necessário adicionar ornamentos que não seriam utilizados, o que é passível de compreensão, e che-gando até mesmo na própria com-posição e organização do espaço arquitetônico da obra, que se mascarava ser o que não era na realidade, o próprio arquiteto posteriormente falar sobre isso, argumentando sobre as dificuldades de se obter os recursos necessários para a execução conforme seu manifesto e ideologia. Com esses fatores em mente, nen-huma de suas obras supriu plenamente sua teoria, dado que sua arquitetura reproduziu apenas os aspectos estéticos da nova arquitetura, mas serviu como o primeiro apelo do modernismo e deram repercussão mundial para o mesmo, colocando o Brasil no cena arquitetônica que no futuro viria a ser de uma grandio-sidade imensa quando comparada com esses primeiros passos.

Gregori Warchavchik

Rino Levi

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warchavchik

Com a grande comoção de pes-soas que partilhavam das opiniões de Lobato, uma onda contrária se formou ao redor de Anita Malfatti e do seus ideais, composta jovens intelectuais, onde Oswald de Andrade assume a liderança e respondeu a Monteiro Lobato no artigo "A exposição de Anita Malfatti" publicado no Jornal do Comércio. Esse grupo de intelectuais, intitulados como “futuristas”, seria o que o grupo que no futuro faria a organização e idealização da Semana de Arte Moderna. As exposições e apresentações da Semana foram vaiadas e criticadas, onde o maior parte do público era conser-vador, mas o objetivo foi atingido: romper com o passado e se libertar da cultura da Europa, além de abrir a mente da classe artística. A visão da imprensa sobre a Semana de Arte Moderna era ou extremamente positiva, pois conhecia o projeto de tornar o Brasil um país inde-pendente da cultura europeia, ou bastan-te negativa, por ser bastante conservado-ra, que desmereciam a proposta que os Modernistas traziam. A participação da arquitetura na semana de arte moderna foi pequena, tendo apenas dois arquitetos, nenhum deles tendo realmente uma ideologia que se pode chamar de modernista mas sim de quebra com o passado e incluídos com o intuito de tornar a semana mais completa. Antônio Garcia Moya, espanhol de arquitetura tradicionalista espanhola, mas que em desenhos demonstrava uma visão mais futurista, que se assemelha ao modernismo por menor presença de ornamentos e equilíbrio entre as formas; E Georg Przyrembel, polonês, apresentou desen-hos de sua interpretação do neocolonial em casas de praia.

Essa grande relação das artes com a arquitetura proporcionaram o caráter inicialmente estético do movimento. A relevância da semana de arte moderna na arquitetura moderna, então, não é expressada pelas obras que foram à exposição nem aos arquitetos que partic-iparam da mesma, mas sim de produzir um cenário propício para a fomentação dessa nova ideologia.

Manifestos de Rino Levi e Warchavchik Dá se início então, apenas alguns anos depois, em 1925, a segunda fase do modernismo quando começava a surgir de fato as manifestações na arquitetura, com os manifestos “A Arquitetura e a Estética das Cidades” de Rino Levi, publi-cado no O Estado de São Paulo, onde Levi elevava a importância da praticidade e economia, do uso de materiais industri-alizados e de uma arquitetura com linhas mais simples, sem ornamentos e verda-deiros em relação à estrutura; e “Acerca da Arquitetura Moderna” de Gregori Warchavchik, publicado no Correio da Manhã, onde Warchavchik defendia a racionalidade da máquina e negava a relação do estilo com o passado; Ambos manifestos estimulavam as mesmas práticas na arquitetura moderni-sta, que eram: Praticidade, economia e redução de ornamentos;Mas se diferiam na ideologia, onde Rino Levi defendia o uso de tradições neoclassicistas para a melhor adequação da arquitetura mod-erna no Brasil, levando em conta o clima, a vegetação e as próprias tradições do local, tudo isso para levar à uma arquite-tura mais adequada; Gregori Warchavchik por outro lado, negava completamente qualquer estilo anterior e comtemplava apenas o avanço da máquina e a estética vinda do seu uso em equilíbrio da sua forma e função.

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as três casas modernistas de warchavchik

Os anos finais da década de 1920 foram decisivos para a concret-ização dos manifestos do arquiteto Gregori Warchavchik. Suas três casas modernistas foram erguidas de maneira a tornar real seus ideais para a arquitetura brasileira; porém, seguir as próprias ideias por vezes se mos-trou um verdadeiro desafio para o artista. É assim que se inicia a análise de suas três casas modernistas: exemplos vivos de que ética versus estética foi um problema real para a materialização de sua arquitetura. Seu Manifesto publicado em 1925 no Correio da Manhã, Rio de Janeiro, em 01 de novembro de 1925, “Acerca da Arquitetura Moder-na” foi pioneiro na propagação das ideias do Movimento Moderno no Brasil. O Manifesto chamava os arquitetos à renovação da arquitetu-ra, a busca de um legado que seria autêntico fazendo críticas a grande importância que se dava a estilos e o quão incoerente eles estavam em relação a sociedade moderna. Adotou o conceito de “máquinas de morar” visto que casas são máquinas que devido ao emprego de variadas técnicas permitem a distribuição racional da luz, calor, água fria e quente, etc; além disso, faz críticas ao decorativismo buscando argumen-tos funcionais e econômicos. É em cima de seu Manifesto que Warchavchik faz as suas casas mod-ernistas.

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a casa modernista da rua santa cruz

A casa da Rua Santa Cruz foi projetada para servir de moradia pro arquiteto e sua família. Projetada em 1927 e construída em 1928 é considerada a primeira obra em arquite-tura moderna implantada. Todo o projeto, a construção, a decoração, os móveis, os interiores e as peças de iluminação foram pensadas pelo arquiteto, além de ter sido sua esposa Mina Klein, que fez o paisagismo da obra, utilizando espécies vegetais tropicais - alguns dizem inclu-sive que esse tenha sido o primeiro projeto pais-agístico moderno do país, afirmação essa que possui algumas divergências. O projeto para a casa teve como objetivo a racionalidade, o con-forto, a utilidade, uma boa ventilação e ilumi-nação. Em termos de fachada, é formada por volumes prismáticos brancos e precisou ser ornamentada em seu projeto para conseguir a aprovação da prefeitura. Warchavchik assim teve de apresentar um projeto ligeiramente camufla-do com ornatos, característica que acabou fican-do de fora do projeto original (construído). A obra possuiu alguns problemas que iam de encontro com os ideais do arquiteto, primeiramente a aprovação, segundo os materi-ais empregados e a mão de obra: o alto preço do cimento e do vidro e a falta de mão de obra com formação técnica pra tornar possível a execução do projeto foram grande debilitado-res para o término da casa. Assim, montou ofici-nas focadas no preparo de esquadrias de madeira e graças a um mestre alemão, apresen-tou ao Brasil o uso de madeira compensada.

Como a obra foi feita para abrigar sua família, de acordo com que ela crescia, a neces-sidade de modificá-la crescia junto. Dessa maneira, em 1935 a casa passou por uma refor-ma e nela foi alterada a lógica de circulação e a composição de volume. Na lateral foi acrescido uma marquise moderna marcando a entrada que agora ficaria ali e não mais na fachada prin-cipal, além disso, a cozinha ficou maior e a varan-da lateral diminui dando espaço para a sala de estar e o volume curvo que é colocado; a laje da sala faz um terraço que circunda o quarto de Mina (o quarto da esposa). As outras modifi-cações foram uma implantação de um sanitário no piso superior bem como um closet (os dois servindo para o quarto de Warchavchik, o quarto do esposo). Um ponto que não pode passar desper-cebido na fachada é a sua falta de ornamentos, as linhas retas, as esquadrias elegantes que por vezes “dobram” juntamente com as paredes (como pode ser visto nas fotos). A n t e s da reforma seu portão era alinhado com a entra-da principal (fachada), remetendo à simetria clássica - que por vezes o arquiteto comenta em seu Manifesto que deve ser usado como um modo de interpretação e de produção de uma arquitetura original, e que posteriormente foi descolado pra esquerda passando a servir mais diretamente a entrada lateral da casa que se tornou a entrada principal depois de sua refor-ma.

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C cozinhaDI dispensaCP copaT terraçoJ sala de jantarL livingST sala de estarD dormitório 15

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a casa modernista da rua itápolis

A casa modernista da Rua Itápolis possui uma composição baseada em linhas, planos e volumes. A obra foi um desafio devido a sua limitação de meios e recursos para sua execução e foi feita de maneira a se desvincular do raciocí-nio projetual tradicional, eliminando corredores e integrando espaços de maneira a produzir áreas mais amplas. O muro em forma de curva, admirado por Le Corbusier em sua visita à casa ainda em construção em 1929, separa o jardim social do quintal de serviços. A quantidade quase acelerada de muros de arrimo impõe imponência e estabilidade à obra. Primeiramente, nota-se um volume prismático de base quadrada que abriga dois pavimentos quase que idênticos. No primeiro andar localiza-se uma sala de estar, sala de jantar, cozinha e banheiro social, além da escada e é rodeada de um trabalho paisagístico moder-no. A entrada principal é acessada pela lateral do terreno, de onde sai um volume que con-tribui para a assimetria da obra. No segundo andar a composição da planta em cruz fica ainda mais evidente local onde se encontra os quartos e um outro banheiro. A planta da casa é simples e funcional, confirmando a ideia inicial de Warchvchik de produzir algo como uma máquina de morar, estandartizada. Vista em planta a obra possui uma sime-tria que divide a parte frontal da posterior, já em sua divisão longitudinal, há uma quase simetria: um lado possui três metros e meio, e outro quatro metros.

A assimetria da obra está na fachada, e há quatro pontos principais que devem ser nota-dos para a compreensão desse “jogo” visual. O primeiro ponto constitui a fachada principal, onde há um conjunto de planos que protegem a varanda frontal; o segundo é o elemento que marca a entrada principal lateral, o plano que “saca” da cozinha; o terceiro são as linhas perpendiculares da varanda da parte de trás da casa e o último é o volume na parte de trás da casa que abriga uma cozinha. Todo esse jogo que por vezes produz uma esquina cega na obra envolve o paisagismo de maneira a não ficar exposta à rua ou ainda cria elementos de cobertura que podem servir para abrigar gara-gem. Outros elementos que contribuem para a assimetria das fachadas são as janelas e portas. Uma vez que os elementos descritos acima somam volume à fachada, as janelas subtraem trazendo consigo um jogo de cheios e vazios que enriquece a plasticidade da obra. Como os elementos assimétricos descritos arremetem a conformação em “L”, a janela principal do quarto abre de maneira sugestiva, porém, o dispositivo que saca da janela engana o observador que está de fora e funciona como uma veneziana. Todos os desenhos de esquadria da obra são de grande esmero no trabalho e no detalhe e apresentam um estilo mais retilíneo, assim como as peças de iluminação. A curva do proje-to só acontece na lateral posterior direita do muro que o cerca.

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C cozinhaT terraçoST sala de estarD dormitórioB banheiro

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a casa modernista da rua bahia - residência luiz da silva prado

Os quatro pavimentos do edifício pos-suem plantas funcionais muito bem marcadas pelos seus fluxos e pelos usos. No subsolo, que só é perceptível pela parte posterior do terreno estão localizadas a garagem, copa, banheiro, refeitório e dormitórios para os empregados; no térreo estão localizadas as salas de jantar, de estar, cozinha, copa e terraço; o primeiro andar possui as áreas mais íntimas como os quartos com closet, escritório e banheiro e o segundo andar por sua vez possui quartos, banheiro e um grande terraço que ocupa quase que toda a planta do pavimento.

A Casa modernista da Rua Bahia, conhe-cida como Residência Luiz da Silva Prado é caracterizada pelos dois volumes brancos ladea-dos que dividem uma parede e pelo grande declive no terreno a qual está implantada. Pela sua localização bem como seu porte e soluções que lhe foram empregadas a casa rompia com a casa burguesa tradicional além de ser uma representação viva das qualidades construtivas e espaciais modernas. Sua fachada principal possui uma grande abertura (seteira) que rasga todos os pavimen-tos de seu volume mais alto e trás luz para o percurso da escada interna, o volume que é rebaixado em um pavimento em relação ao maior possui uma fachada principal completa-mente fechada com um balanço que produz uma cobertura que dá acesso a entrada princi-pal. Todo o volume possui poucas e espaçadas aberturas e toda a obra é um volume branco sem qualquer ornamentação. Na parte posterior, surge um quarto pavi-mento semienterrado além de possuir platôs que possuem jardins e estão interligados por escadas. Ainda, pode-se perceber pilares de borda soltos que influenciam na compreensão da estrutura independente. Na parte superior nota-se um terraço no menor bloco que é acessado pelo bloco mais alto, permitindo que o visitante tenha uma visão 360° de toda a região em que a obra está implantada. Toda a obra possui um sofisticado jogo de escalonamento de níveis e passagens que só é possível graças ao terreno escolhido que possui um declive de onze metros.

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C cozinhaDI dispensaCP copaT terraçoJ sala de jantarL livingST sala de estarD dormitórioG garagem

Bibliografia:

Matéria Archdaily por Igor Fracalossi - Clássicos da Arquitetura: Casa Modernista da Rua Santa Cruz / Gregori Warchavchik, 2013José Tavares Correia de Lira, "Ruptura e Construção: A Obra de Gregori Warchavchik", em Novos Estudos, no. 78, Centro Brasileiro De Analise e Planejamento (CEBRAP), 2007Matéria Vitruvius por Mauro Claro: Ambientes modernos - A casa modernista da Rua Santa Cruz, de Gregori Warchavchik, e outras casas da modernidade, 2008Artigo Warchavchik e o Manifesto de 1925 por Renato Holmer Fiore, 2002/1Matéria Archdaily por Igor Fracalossi - Manifesto: Acerca da Arquitetura Moderna / Gregori Warchavchik, 2013Alberto Xavier (org.), Arquitetura Moderna Brasileira: Depoimento de uma Geração, ABEA/FVA/PINI, São Paulo, 1987.Matéria Archdaily por Igor Fracalossi - Clássicos da Arquitetura: Casa Modernista da Rua Itápolis / Gregori Warchavchik, 2013Arquicultura FAU USP - Ficha de Identificação das Obras de Warchavchik, 2011Artigo Um Especial dedicado a Arquitetos - Arquitetura Moderna no IV Centenário de São Paulo por Miguel Antônio BuzzarMatéria Archdaily por Igor Fracalossi - Clássicos da Arquitetura: Casa Modernista da Rua Bahia / Gregori Warchavchik, 2015.

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samogispai

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O paisagismo de Mina

Na década de 20 Gregori Warchavchik projetou uma casa com a intenção de residir sua família e esta tornou-se, unida com o paisagismo de Mina Warchavchik, representação de uma mudança cultural surgida no movimento modernista que acontecia em São Paulo. Para que a importância dos jardins projetados por Mina sejam entendidos, é necessário conhecer o contexto da época e correlacionar os dois assuntos. Desta forma, o aspecto mais importante e de destaque em suas obras é que os jardins realizados pela paisagista são considerados pioneiros no uso de plantas tropicais características do país. Tanto a casa modernista de Gregori, marco para a arquitetura modernista, e o projeto de paisagismo de Mina podem ser consideradas obras de transição e início de uma nova tendência. O paisagismo de Mina traduz uma referência inovadora para os projetos brasileiros da época, principalmente em São Paulo. Ao contrário do que se fazia naquele época, Mina não seguiu o estilo europeu para a linguagem de seus jardins. Foi um dos primeiros jardins a fazer sua composição inteiramente com espécies tropicais, sendo que algumas delas não eram utilizadas neste contexto mesmo contendo significado social e cultural. Entende-se que mina utilizou inspiração na linguagem da vanguarda dos jardins contemporâneos da França e da Bélgica, que naquele momento (década de 20) estavam também influen-ciados pelo ambiente da Exposição de Artes decorativas e das Artes Abstratas.

por Guilherme Reis

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Em termos paisagísticos, o jardim de Mina para a casa modernista utiliza de pisos formados por retângulos irregu-lares com a presença de grama em suas extremidades e a vegetação é composta por cactos, dracenas, pinheiros, agaves, guapuruvus entre outras. O cacto tem bastante destaque dado por Mina, tornando-se um dos, se não o mais, elementos marcantes em seus jardins. O cacto é um elemento presente no repertório das primeiras pinturas mod-ernistas de São Paulo e já era utilizado como fonte de arte e cultura local. Por fim, o jardim enquadra a construção de Gregori, procurando sempre cobrir pare-des cegas e demarcar percursos. Árvores de espécies pouco utiliza-das foram implantadas no pátio interno da casa. Plantas deste tipo podiam ser encontradas em poucas praças e parques e constituiu uma espécia de bosque que resistiu ao abandono após a venda da propriedade.

É importante visar a importância de Mina para o paisagismo modernista no Brasil. Toda a sua obra não atingiu qualquer tipo de visão urbana e seus jardins são conhecidas de forma indireta. Em outra visão, Mina criou um tipo de paisagismo ousado e inédito, estando bem relacionada a casa modernista de Gregori. Embora a paisagista seja pouco conhecida por seus projetos e fique, ainda hoje, na sombra de seu marido e de projetos de paisagistas mais conhecidos como Rosa Kliass, seu projeto para a casa modernista reformulou o olhar brasileiro sobre o paisag-ismo moderno. Mina iniciou o que posterior-mente ficou conhecido como o paisagismo tropical brasileiro.

http://jardimdecalateia.com.br/arquitetura/paisagis-mo-avant-burle-marx-casa-modernista-warchavchik/

http://jardimdecalateia.com.br/arquitetura/o-bosque-mod-ernista-de-mina-klabin-e-warchavchik/

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biliàriomo

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Quando surge o Modernisno, movimento cultural marcado pela ruptura com a tradição na procura de novas expressões formais técnicas e estéticas que correspondessem ao progresso e aos novos gostos das socie-dades ocidentais, as discussões do design voltam-se para a questão da produção em série, dos materiais indus-triais, das possibilidades de produzir artigos antes restritos ao mercado de luxo e a percepção de uma sociedade em transformação. O design, nestes primeiros anos do século XX, mantém um diálogo com as vanguardas da arte mod-erna (Cubismo, Futurismo, De Stijl, Con-strutivismo, Surrealismo e Dadaísmo) que exercem influências mais significativas no design gráfico, mas que também influen-ciam o design de produtos, interiores e arquitetura. O mobiliário projetado pelos grandes artistas da época sofreu uma grande mudança. Agora era utilizado o conceito de móveis desmontáveis e utilização da alta tecnologia aliada à madeira. Os artis-tas começaram a ser vistos como pensa-dores do espaço urbano. A arte feita era voltada para o cotidiano, respeitando o conceito do Funcionalismo, difundido pela Bauhaus, primeira escola de design no mundo, dando início ao Modernismo e sendo sua principal influência.Com a Revolução Industrial começa a produção em massa. Com ela vem a disputa entre produtos artesanais e industrializados, o conhecimento sobre novos materiais e a classe média atinge um maior poder aquisitivo, tendo um maior poder de consumo. Assim, os artis-tas quiseram revalorizar os objetos atribu-indo-lhes qualidade formal e estética, trabalhando-os e produzindo-os para a indústria.

O mobiliário da década de XX

Cadeira Wassily (1925)

Cadeira Barcelona (1929)

Poltrona Cubo (1928 )

por Carolina Braga

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Como pioneiros do desenho de mobiliário modernista, temos Marcel Breuer, com a Cadeira Wassily, em 1925, Mies Van der Rohe, com a Cadeira Barce-lona, em 1929, Le Corbusier, Pierre Jean-neret e Charlotte Perriand, com a Poltrona Cubo, em 1928 e a Chaise Longue, também de Le Corbusier, em 1928. A influência dessas obras no Brasil resul-tou em móveis leves e extremamente funcionais, fazendo grande uso da madeira, tornando-se sutis e elegantes. Os principais nomes dos artistas brasile-iros foram Joarquim Tenreiro, José Zanine Caldas Sérgio Rodrigues, Lina Bo Bardi, Paulo Mendes da Rocha, Oscar Niemeyer e Gregori Warchavchik. Warchavchik era ucraniano porém foi naturalizado brasileiro poucos anos após chegar ao Brasil. Ficou famoso pois projetou e construiu para si aquela que foi considerada a primeira residência moderna do país. O projeto, a con-strução, a decoração, os interiores, os móveis e as peças de iluminação são de sua autoria. O mobiliário de Warchavick teve influência de Le Corbusier e do estilo Art Déco. Apesar de tais influências, defendia que os artistas deveriam se desvincular do passado e não pensar em estilos, priorizando apenas o funcional. Seus móveis foram feitos em madeira, pos-suíam uma linguagem extremamente racional, funcionalista e geométrica, utili-zando-se de poucas linhas e planos, fazendo referência principalmente à arquitetura de seus projetos.

Chaise Longue. (1928)

Espreguiçadeira Rio, Oscar Niemeyer (1977-78)

Cadeira Três Pés, Joaquim Tenreiro (1947).

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"Para que a nossa arquitetura tenha seu cunho original, como o tem as nossas máquinas, o arquiteto moderno deve não somente deixar de copiar os velhos estilos, como também deixar de pensar no estilo. O caráter da nossa arquitetura, como das outras artes, não pode ser propriamente em estilo para nós, os contemporâneos, mas sim para as gerações que nos sucederão. A nossa arquitetura deve ser apenas racional, deve basear-se apenas na lógica e esta lógica devemos opô-la aos que estão procurando por força imitar na con-strução algum estilo." Gregori Warchavchik.

Carrinho de Cha Warchavchik

Mesa Circular Warchavchik

Banqueta Warchavchik

Banqueta Warchavchik

Revisteiro Leque Warchavchik

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bamo

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O Brasil passava por um período de modernização, onde o capitalismo avançava em busca de novas matérias primas e novos mercados, e o país não tinha infraestrutura para isso. A paisagem urbana do Rio de Janeiro neste momen-to era vista como “Porto Sujo” ou “Cidade da Morte”, com uma falta de planejamen-to urbano e infraestrutura sanitária a capi-tal era o centro de várias doenças, como a febre amarela, sarampo, tuberculose e demais outras. O crescimento populacional da cidade era grande e favorecia a dissemi-nação das patologias. E o problema habitacional causado pela chegada da corte portuguesa era outro fator que levou os governos federal e municipal a criarem, cada qual, seu projeto de refor-ma do Rio de Janeiro. Ordenado por Pereira Passos, a reforma da capital tinha o objetivo de sanear, controlar a propagação de doenças e modernizar o tráfego, além da comunicação entre as regiões da cidade. E um dos principais pontos era a erradi-cação dos cortiços e casas de cômodos, do qual seu plano ficou conhecido como “bota abaixo”, com a intenção de valorizar os espaços centrais, dando nova fisiono-mia arquitetônica á cidade. Ação que resultou na criação das favelas e a ocu-pação dos morros, pois com a desocu-pação do centro da cidade, a população foi para o subúrbio, longe dos locais de trabalho ou para os morros próximos do centro, como uma alternativa de está ao alcance de suas atividades. Com ruas estreitas pavimentadas com pedras redondas e sem calçadas, ladeadas por casas de um ou dois andares, o Rio de Janeiro conservava muito de seu aspecto colonial; os trans-portes, por exemplo, eram feitos princi-palmente com tração animal.

O prefeito então decide adotar a capital de fisionomia e serviços moder-nos, exigindo que toda via aberta á circu-lação fosse devidamente pavimentada e munida de canalizações de água, gás e esgoto; que no discurso se fez valer no traçado de grandes artérias monumen-tais que facilitaram as comunicações entre os pontos da cidade. Como as duas diagonais, a Avenida Central e a Avenida Mem de Sá, cortando o xadrez das ruelas do centro da cidade. Outras vias impor-tantes foram feitas ou alargadas para completar essa nova rede, com praças e jardins inserindo se dentre elas. Pereira Passos estudou na França e durante esse período assistiu a reforma urbana de Paris promovida por Hauss-mann, o que o levou a ter influência em suas intervenções no urbanismo da cidade, de ordem sanitária, viária e estéti-ca. A semelhança é algo bem visível, com os mesmos princípios das grandes artérias, chegando a retomar, a largura da Avenida Central as dimensões dos bule-vares do prefeito parisiense. Em relação á arquitetura, fora instituído um concurso interacional para a escolha das fachadas que iriam alinhar-se na avenida principal. Se o plano de Pereira Passos enfo-cava embelezar a cidade, e que permitiu a capital ter um novo começo; surge Carlos Sampaio com sua política higienis-ta para as reformas urbanísticas. Alguns pontos se repetem em relação ao de Pereira Passos, como a expulsão da classe humilde do centro da cidade e agora também dos subúrbios; abertura de vias, como a Avenida Rui Barbosa, obras de saneamento e embelezamento da Lagoa Rodrigo de Freitas.

“BOTA ABAIXO” : as reformas urbanas do RJpor Douglas Duarte

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Foi durante seu plano que o morro do Castelo foi arrasado, com a desculpa da necessidade para a monta-gem da Exposição do Centenário da Independência do Brasil. Morro que foi a sede do primeiro estabelecimento dura-douro dos portugueses, que retirado sem prever as consequências como o desaparecimento de vestígios históricos e monumentos antigos importantes, como o Colégio dos Jesuítas. Liderado por Alfred Hubert Donat Agache, o plano Agache foi o primeiro plano diretor para a cidade do Rio de Janeiro, que após examinar todos os problemas teóricos e práticos, fez uma série de conferências sobre o assunto e finalmente apresentou suas soluções em um relatório. Colocado o urbanismo em relação com as questões referentes á vida da cidade, alguns elementos deviam ser conservados, as necessidades gerais, a superfície e o número de habitantes, os edifícios públicos e a repartição dos espaços livres. Com três pontos princi-pais, a circulação, a higiene e a estética. Com o plano de Pereira Passos no centro da cidade, sua política foi continu-ada com amplitude decuplicada e maior coerência, com a execução de grandes avenidas e praças cuidando-se das perspectivas terminais constituídas quer por edifícios existentes utilizados para esse fim, quer por monumentos moder-nos a serem erguidos. O sistema viário estava mais bem definido e não respon-dia mais apenas ás necessidades práticas, ele tinha sido avaliado com funções mais nobres, com uma geometria mais pura.

Foi o plano Agache que serviu de base para o estabelecimento de planos posteriores, em 1937, um órgão especial-mente encarregado de elaborar um plano piloto. Órgão que trabalhou dez anos no plano e concluiu por um projeto cujas linhas mestras continuam válidas até hoje, apesar de certos retoques e de uma execução mais ou menos intensa pelas várias administrações municipais e governamentais que se sucederam.

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http://pre.univesp.br/as-reformas-do-rio-de-janeiro-no-ini-cio-do-seculo-xx#.V2sz1rgrLIU

http://www.comciencia.br/comciencia/?section=8&edi-cao=56&id=712

http://www.revistadehistoria.com.br/secao/reportagem/pas-sado-que-condena

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O prefeito então decide adotar a capital de fisionomia e serviços moder-nos, exigindo que toda via aberta á circu-lação fosse devidamente pavimentada e munida de canalizações de água, gás e esgoto; que no discurso se fez valer no traçado de grandes artérias monumen-tais que facilitaram as comunicações entre os pontos da cidade. Como as duas diagonais, a Avenida Central e a Avenida Mem de Sá, cortando o xadrez das ruelas do centro da cidade. Outras vias impor-tantes foram feitas ou alargadas para completar essa nova rede, com praças e jardins inserindo se dentre elas. Pereira Passos estudou na França e durante esse período assistiu a reforma urbana de Paris promovida por Hauss-mann, o que o levou a ter influência em suas intervenções no urbanismo da cidade, de ordem sanitária, viária e estéti-ca. A semelhança é algo bem visível, com os mesmos princípios das grandes artérias, chegando a retomar, a largura da Avenida Central as dimensões dos bule-vares do prefeito parisiense. Em relação á arquitetura, fora instituído um concurso interacional para a escolha das fachadas que iriam alinhar-se na avenida principal. Se o plano de Pereira Passos enfo-cava embelezar a cidade, e que permitiu a capital ter um novo começo; surge Carlos Sampaio com sua política higienis-ta para as reformas urbanísticas. Alguns pontos se repetem em relação ao de Pereira Passos, como a expulsão da classe humilde do centro da cidade e agora também dos subúrbios; abertura de vias, como a Avenida Rui Barbosa, obras de saneamento e embelezamento da Lagoa Rodrigo de Freitas.

entrevista

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Originalmente produzido como Tese de Livre-Docência, Warchavchik: fraturas da vanguarda nasce como obra de referência para o estudo do arquiteto tanto em termos de con-teúdo quanto em sua forma, pois as perguntas, os caminhos teórico-metodológicos, a interdis-ciplinaridade e o levantamento documental exaustivo – realizado mesmo em terras romanas e odessitas – fazem com que a pesquisa explore novas facetas sobre o legado de Warchavchik, das consagradas obras do perío-do inicial aos empreendimentos imobiliários ligados ao processo de verticalização da cidade de São Paulo, descortinando um universo até então pouco ou nada conhecido e possibilitan-do uma nova leitura das obras “clássicas” à luz dessa perspectiva de conjunto. Entrevistado em dezembro de 2010 em sua sala no Centro de Preservação Cultural da Universidade de São Paulo (CPC-USP), que atualmente dirige, José Lira nos fala de sua obra recém publicada.

Em Warchavchik: fraturas da vanguarda, lançado em abril de 2011 pela Cosac & Naify, José Lira se lança ao ambicioso empreendimento de reconstituir a trajetória de Gregori Warchavchik, varrendo em profun-didade de seu período de formação em Odessa até os anos 1950, não só preenchendo significativas lacunas historiográficas, mas trazendo nova perspectiva em relação ao papel e significado da obra do arquiteto no processo de formação do sistema arquitetônico mod-erno brasileiro. Entre os méritos do livro está a descon-strução de alguns dos mitos e explicações acerca de Warchavchik, como do europeu colonizador que sozin-ho, por esforço próprio, transplanta para o Brasil seu repertório de vanguarda ou a responsabilização exclu-sivamente pessoal pelo arrefecimento de sua produção a partir da segunda metade da década de 1930. Lira oferece um novo tratamento ao person-agem, “tão onipresente quanto mal conhecido”, demonstrando o poder que o exame de uma trajetória tem enquanto estratégia transversal para a reflexão sobre as próprias tensões no processo de modern-ização brasileira – bem como para revelar as fraturas do projeto moderno, enunciadas no trabalho.

Gregori Warchavchik: de Odessa a São PauloEntrevista com José LiraDenise InvamotoEditada pela equipe ARTHIS

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Denise Invamoto: Em uma entrevista em que o Geraldo Ferraz concedeu para o Ricardo Souza (1), ele afirma o contato efetivo de Warchavchik com a obra do Loos ainda na Itália, onde também trabalha com Piacentini e pode ter conhecido os projetos de Sant'Elia. Pode-se identificar alguma presença destes autores na obra do arquiteto?José Lira: Efetivamente a gente sabe que a narrati-va do Geraldo Ferraz investe nessa idéia de uma matriz de vanguarda que vem de Loos e do futuris-mo italiano, assim como da Bauhaus. Mas é preciso dizer que não há indícios de um contato direto de Warchavchik com essa produção, ainda que na revista Architettura e Arti Decorative, Piacentini tenha publicado no começo dos anos 20 alguns artigos sobre a produção de arquitetura européia contemporânea, com referências elogiosas a Loos, Hoffman, Behrens, Messel e Le Corbusier, e sua validade em um contexto reconhecidamente atrasado como o italiano mas de fundas raízes med-iterrâneas. Mesmo aí é difícil falar em influência. E ademais se há no meio italiano uma informação de vanguarda em circulação, até a segunda metade da década, como se sabe, a produção arquitetônica local é quase impermeável a ela. Eu não encontrei qualquer indício objetivo desse contato prévio de Warchavchik com o futurismo, nem tampouco com o purismo, o neo-plasticismo ou a nova objetivi-dade, e muito menos com o construtivismo, como outras vezes se apontou, que sequer havia produzi-do alguma expressão arquitetônica naquele momento. Aliás, os projetos ucranianos e italianos que o próprio Geraldo Ferraz publica, apesar de muito diversos entre si, falam antes de uma preocu-pação com programas tradicionais, como o palacete, o teatro, o templo, no máximo com as novas tipologias habitacionais que a reconstrução do pós-guerra estimulava, inclusive junto aos ateliês de Piacentini, Innocenti e Roster, onde Warchavchik trabalhou, e nos quais se reconhece a dominância do neoclássico, do barochetto, do Déco, da arquitetura menor, de certo Art Nouveau, ou antes de algumas correntes simbolistas tipicamente russas, como as praticadas por Ivan Fomin no início do século XX.

É nesse universo repertorial que Warchavchik se movimenta neste momento. Se alguma coisa pode aproximá-lo da arquitetura de Adolf Loos é talvez algo que não é exclusivo a Loos, mas que aparente-mente pertence a uma ética de depuração do estilo, de sabor anti-formalista, anti-decorativo própria à cultura arquitetônica do pré-guerra em contextos muito diversos. Ao que parece essa asso-ciação a Loos nasce das leituras da Casa da rua Santa Cruz. Mas se é possível nela reconhecer elementos loosianos, que serão praticados de maneira bastan-te livre, e talvez inconsciente ainda que muito potentes em projetos posteriores, o que salta aos olhos ali são justamente as suas ambigüidades e estratégias conflitivas, as tensões entre gestos de ruptura e acomodação, um referencial clássico redi-vivo e certo purismo que insurgia, que se evidencia no uso dos materiais, na planta, no contraponto entre as fachadas, no jogo de proporções, de aber-turas, de perspectivas, nas matemáticas dessa casa ideal construída em latifúndio suburbano de uma metrópole periférica. E talvez seja isso que faça dessa casa algo tão emblemático de um momento da cultura brasileira, de um momento da arquitetu-ra brasileira. Foi apenas por isso que achei válido dedicar um capítulo inteiro à análise do primeiro projeto para a rua Santa Cruz.

DI: Me parece que sua interpretação sobre a casa traz a ela um novo estatuto no interior do campo historiográfico e isso talvez decorra do seu modo de tratar o problema da análise de obra. Em um trecho na introdução, à página 11, você diz: “é necessário em primeiro lugar ultrapassar a condição imediata das obras como construções acabadas e conhecer sua dimensão fragmentária e dividida, haja vista sua inscrição no mundo da produção e do consumo; de um lado descortinan-do o interior da síntese aparente das obras, sua desunidade e disseminação, e de outro fazendo explodir a continuidade, identidade e transparência da própria experiência individual” (2). Queria que você falasse um pouco disso.

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JL: Nós arquitetos, quando olhamos para as obras modernas e para a figura do arquiteto moderno, tendemos a pensar nas obras como coisas autôno-mas e nas decisões de projeto como gestos sober-anos. Há uma tendência a pensar esta unidade, esta identidade perfeita das obras, a idéia das obras como coisas indivisas, fechadas em si, acabadas, separadas de tudo que lhes cerca. Esse é certa-mente um dos fetiches da arquitetura moderna, e também da historiografia. Eu diria que uma história da arquitetura que tem como objeto obras isoladas, vistas como emanação direta e soberana do arquiteto, esbarra em interpretações complicadas.Por exemplo: de obras bastardas em relação a projetos autônomos, do processo da arquitetura como produção solitária de arquitetos, das circun-stâncias externas ao trabalho projetual como obstáculos à sua plena realização. Ora, jamais uma obra de arquitetura foi, e jamais provavelmente ela será um produto solitário do arquiteto. E isso por várias razões: por ela se entregar imediatamente ao uso, e portanto por sua apropriação social; pelo fato de se dar à fruição no urbano, como tal tornan-do-se inseparável das estruturas econômicas e de poder; pela condição coletiva de sua produção, envolvendo atores, saberes, práticas e interesses muito diversos, pelo fato dela se confundir, enquan-to obra coletiva, pública, social, com processos que lhe são constitutivos, de divisão de trabalho, de divisão de competências, de divisão, regulação e valorização da terra, da propriedade, da privativi-dade, do capital etc. Ou seja, na constituição mesma da arquitetura há processos, relações, agên-cias, práticas, atores, que aparentemente externos ao momento do projeto, o delimitam, o condicio-nam, o modelam por dentro. Ou seja, no momento mesmo em que o arquiteto projeta, ele o está fazendo sempre de acordo com determinadas necessidades psíquicas e sociais, com certas notas mais ou menos dominantes na cultura arquitetônica, com recursos materiais e con-strutivos bem específicas, no quadro de encomen-das materiais e simbólicas, nos limites de um deter-minado terreno, uma legislação, fatores de local-ização e inscrição espacial, um determinado investi-mento de capital – que não é pequeno no caso da arquitetura, etc, etc.

Mesmo obras de vanguarda, que se definem por transcenderem ou tensionarem tais circunstâncias da produção, por sua marginalidade em relação ao público, ao gosto dominante, aos recursos materiais, ou por seu grau de autonomia, autoria, autoridade, revelam sua inevitável aderência a certos denominadores comuns. Sem determinis-mo ou sociologismo, nem imperialismo formalis-ta, eu diria – parafraseando Antonio Candido – ser necessário de uma vez por todas assegurar certa reversibilidade entre o formal e o não formal em arquitetura, surpreender o social na imanência mesma do valor estético. É hora de pensarmos o sucesso ou insucesso arquitetônico, de analisarmos ou julgarmos as obras de arquitetura não apenas a partir da intenção, da reflexão ou da decisão aparente-mente solitária do arquiteto em face do vazio ou do papel em branco. Mas de pensarmos o valor das obras a partir do modo como elas se inscre-vem, enfrentam e respondem a conteúdos que, pertinentes ao estético, intervém no processo de realização da arquitetura. Eu tentei, desse ponto de vista, olhar para as obras de Warchavchik, parar diante delas, olhar os projetos, as obras que foram construídas, que ainda estão de pé ou não, suas imagens, partindo dos dados disponíveis a seu respeito, articulando-as no tempo, na sociedade, na cultura, na economia, no espaço urbano, enquanto fatores da própria produção arquitetônica. Foi nesse sentido que procurei reconhecer – seguindo aquilo que Tafuri propõe em seu projeto histórico – a desunidade, a frag-mentação, a divisão, a disseminação nas obras de Warchavchik, e nelas algumas das fraturas da vanguarda arquitetônica.

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Denise Invamoto: E quanto à seleção das obras?José Lira: Eu fiz questão de repassar as casas modernistas, porque achava que elas continua-vam a ser vistas como uma coisa só, como expressão de tais ou quais correntes de vanguar-da, sem especificidade, sem embates com o local. Então eu achei que era importante reexaminar as principais obras modernistas do arquiteto, tanto as casas individuais, Santa Cruz, Melo Alves, Avan-handava, Itápolis, Bahia, Toneleros, Raul Pompéia e todas as outras, quanto os conjuntos de habi-tação coletiva, da Mooca, da Vila Mariana, de Gamboa, não tanto por serem das primeiras real-izações modernistas no país, mas porque nelas, neste curto período de tempo, e nesse conjunto aparentemente homogêneo de obras, era pos-sível observar mudanças significativas, impor-tantíssimas, inovações, variações nas referências, nas citações, e muita experimentação formal, espacial, técnica. Na seleção das obras eu tentei considerar momentos diversos de criação projetu-al, momentos de mudança, inflexão e variação em sua folha corrida. E certamente ultrapassar o “cânone warchavchik”, incluindo projetos como a Sede do Clube Paulistano, que efetivamente é um projeto coletivo, e que testemunha a necessidade do arquiteto de passar pela produção brasileira mais festejada naquele momento, o que se mani-festa também no projeto para o Automóvel Clube, onde é muito interessante flagrar a disposição do arquiteto – não é hesitação, ele sabe exatamente o que está propondo – para dialogar com competência com estéticas muito diversas, e mesmo antitéticas naquele momento.

DI: Warchavchik revela assim um desprendimen-to?JL: Um desprendimento em propor um projeto clássico moderno de um lado, e de outro um edifício niemeyeriano, corbusieriano, para um terreno lindeiro à praça dom José Gaspar, área que passava por obras de reurbanização. Eu prior-izei tecer uma discussão em torno de arquitetura moderna e da ideia de vanguarda no Brasil através da obra de warchavchik.

Por isso um grande número de projetos não foi analisado ou apenas mencionado de passagem: projetos de orientação acadêmica, pitorescos, as dezenas de bangalôs etc. Porque o que me inter-essava pensar a partir da discussão sobre arquite-tura moderna, era isso que chamei metaforica-mente de “fraturas da vanguarda”, essas rupturas, movimentações, deslizamentos, cortes, aco-modações, estabilizações no projeto moderno, dos gestos canônicos às tendências à estilização, ao kitsch, à contemporização com as circunstân-cias, as oportunidades, as encomendas, valorizan-do os impasses da criação arquitetônica, as con-tradições do processo criativo no âmbito mesmo da produção moderna de arquitetura.

DI: Sobre a questão da fratura, fica claro um refer-encial muito forte em Tafuri e Otília Arantes na tese. O Warchavchik é pensado como estratégia para evidenciar a fratura do projeto moderno. Entretanto, ao contrário deles – que são por vezes acusados de não valorizar a análise de obra, de entendê-las como epifenômeno ou reflexo – no seu trabalho a forma como mediação das questões da sociedade é um aspecto central. Como você trabalhou estas duas referências?JL: Bom, tanto o trabalho de Tafuri como o de Otília foram leituras muito importantes em minha formação. Entre eles, uma questão comum me interessou pensar aqui. Em Projeto e Utopia, Tafuri colocou em questão o nexo entre a grande ideo-logia alemã da modernização no começo do século XX e os projetos contemporâneos de reor-denação total do espaço habitado. Em seu livro, de fato, é possível apontar certa recusa à leitura de obras, motivado talvez pelo propósito de exam-inar a utopia revolucionária das vanguardas, a gestão social-democrata da cidade e o projeto construtivo weimariano à luz das exigências colo-cadas ao trabalho intelectual pela realidade produtiva em vias de reorganização. Eu até discor-do da idéia de que em Tafuri, ou mesmo nesse trabalho fundamentalmente de crítica ideológica, não haja análise de obras.

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Parece-me ao contrário que se ele tende a uma postura um tanto lacônica em relação às obras singulares, e a certa indiferença ao nível autoral, é possível reconhecer uma gradual aproximação ao objeto entre o comentário acerca da politização da arquitetura nas Siedlungen e a leitura formal do plano Obus. Por mais sucinto que seja, e pleno de ceticismo e ironia, o discurso tem um rendi-mento interpretativo fantástico quanto aos instru-mentos e escalas de intervenção no espaço. Assim, também em Otília, o desapego incide contra o fetiche das obras. Digo desapego porque quando ela se propõe a fazer leitura de obras, ela o faz com grande perspicácia. O prob-lema é que em geral ela se recusa a isso. Principal-mente quando escreve. Se então por vezes o cenário que pintam é desolador, e a recusa à arquitetura parece um tanto assoberbada, temos neles alguns dos insights mais fecundos para pensar a relação entre metrópole e vanguarda, trabalho abstrato e abstração artística, modos de produção e estrutura da experiência cultural. O trabalho que Tafuri fez sobre a cidade americana, sobre o lugar do arranha-céu na reorganização global do espaço metropolitano foi para mim inspirador e ao meu ver ainda está por ser aprove-itado pela historiografia da arquitetura. Talvez por preconceito teórico ou político, e no Brasil eu diria que o investimento excessivo na idéia de que a arquitetura moderna é fundamentalmente obra de um Estado demiúrgico fez com que este víncu-lo entre vanguarda intelectual e vanguarda do capital tenha por muito tempo passado desperce-bido. Em vários momentos do meu trabalho procurei mostrar como este elo entre cultura e economia, arquitetura e cidade, projeto e produção material é importante. Por exemplo, para apanhar a relação entre o conjunto de proje-tos de Warchavchik e as circunstâncias da encomenda ao seu redor, na qual se incluem tanto as necessidades de valorização simbólica do capital imobiliário dos Klabin como, sobretudo a partir dos anos 50, as demandas colocadas por uma cidade como São Paulo que se urbaniza e verticaliza com uma rapidez impressionante.

É importante termos em mente que, nesse processo, empresas como a Warchavchik & Neu-mann desempenharam um papel central, bem mais relevante do que aquele cumprido pela arquitetura de autor ou os circuitos de consa-gração. Gostemos ou não de seus resultados, e se do ponto de vista da história disciplinar sua con-tribuição é discutível, são empresas como aquela que efetivamente produzem a cidade em que habitamos, ou pelo menos intervém sensivel-mente em sua produção material. O que coloca questões importante ao historiador da arquitetu-ra, sobretudo quando ele se propõe a enfrentar a dimensão pública da arquitetura ou a discutir arquitetura com um público mais amplo. Ao meu ver, a trajetória de Warchavchik nos permite ativar algumas hipóteses historiográficas, e a repensar interpretações canônicas ou de revisão da história da arquitetura moderna no Brasil, ao iluminar sen-tidos diversos da vanguarda e perfis emblemáti-cos do arquiteto – do arquiteto anônimo ao expoente de vanguarda e ao arquiteto de merca-do, atuando junto a outros agente imobiliários. Agora, por mais que tenhamos certas prevenções ante pronunciamentos de vanguarda, autonomia, identitários, reconciliatórios, tão sonoros e grandil-oqüentes quanto os da arquitetura moderna, a gente não pode ignorar que a riqueza das obras de arte e de cultura está em sua pluralidade. Elas respondem de maneira diversa a demandas, solicitações, injunções e circunstâncias similares. E essas múltiplas respostas falam justamente do dinamismo e da complexidade da sociedade e da cultura que as produz, o que exige do historiador certo grau de desprendimento, um gesto de inocência voluntária perante as obras, como se em cada uma delas fosse capaz de surpreender algo não previsto, algo de novo, de estranho, de embaraçoso.José LiraArquiteto formado pela UFPE (1989), licenciado em Filosofia pela USP (1999), doutor e livre-docen-te pela FAUUSP (1997 e 2008, respectivamente), onde leciona desde 2003. Autor de "Warchavchik: Fraturas da vanguarda" (Cosac & Naify, 2011), organizou a quarta edição do livro "Caminhos da Arquitetura", de Vilanova Artigas (Cosac & Naify, 2004), bem como as coletâneas "Tempo, Cidade e Arquitetura" e "Cidade: impasses e perspectivas", publicando também diversos artigos. Atualmente dirige o Centro de Preservação Cultural da USP (CPC-USP).Denise InvamotoArquiteta formada pela FAUUSP (2005), mestranda pela mesma instituição na área de História e Fundamentos da Arquitetura e do Urbanismo com a pesquisa Relações entre historiografia e preservação na obra de Gregori Warchavchik, financiada pelo CNPq. Trabalhou no escritório Barossi & Nakamura (2005-2006) e atualmente está licenciada do Departamento do Patrimônio Histórico de São Paulo (2006-2010).EntrevistaA entrevista foi realizada no dia 14 de dezembro de 2010 na Casa da Dona Yayá, sede do CPC-USP. Agradecemos a José Lira pela disponibilização das imagens.

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIAFACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO

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